sexta-feira, 26 de abril de 2013

Sobre destemperos e diarreias

Renan Calheiros (PMDB/AL) decidiu soltar o verbo. “O papel do Legislativo é zelar pela sua competência. Da mesma forma que nós nunca influenciamos decisões do Judiciário, não aceitamos que o Judiciário influa nas questões legislativas. Nós consideramos isso uma invasão e vamos entrar com agravo regimental”, afirmou o presidente do Senado. O motivo de toda ira foi uma liminar emitida pelo ministro do Supremo, Gilmar Mendes, que paralisou a tramitação de um projeto de lei, em andamento no Senado.

Não vamos aprofundar aqui essa tal “competência” do Congresso Nacional, a que Calheiros se referiu, nem tampouco todo casuísmo eleitoral embrulhado para presente no tal projeto de lei cuja tramitação foi barrada pelo ministro Gilmar Mendes. Um casuísmo que, por si, já coloca a tal “competência” mencionada numa fria descarada... Mas não é esse o caso.

A questão aqui está justamente nessa alegada crise institucional entre o Poder Legislativo e o Poder Judiciário. Para os inquilinos do poder, o Supremo Tribunal Federal tem se tornado um verdadeiro tormento, com essa sua mania de querer dizer o que é correto ou não fazer com nosso pobre dinheirinho e que financia a farra desses condôminos.

Um dia antes da decisão do ministro Gilmar Mendes vir à tona, a Comissão de Justiça e Redação aprovou a tramitação de um projeto de emenda constitucional que submete as decisões do STF ao Congresso Nacional. Não custa lembrar que o STF é a instância maior do Poder Judiciário e uma de suas funções é exatamente fiscalizar o cumprimento da lei – em especial, da Constituição. E se também lembrarmos que um dos princípios da Democracia é o equilíbrio entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, fica mais do que óbvio que esse projeto de lei aprovado pela CCJ é uma afronta, não a mim ou ao meu vizinho, mas à própria Democracia.

Ainda assim, a questão é outra. O fato é que o ministro Gilmar Mendes não saiu da sua cama com o pé esquerdo e decidiu, numa crise de mau humor, que iria congelar a tramitação do Projeto de Lei que trava a criação de partidos. Nem tampouco tomou essa decisão durante o café da manhã, enquanto lia os jornais matutinos. Nada disso.

A decisão do ministro do STF foi provocada por um mandado de segurança impetrado pelo senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF). Como em qualquer situação, o Judiciário só se manifesta quando é provocado. E, provocado, toma suas decisões com base na lei. Neste caso não foi diferente. Mendes tomou como ponto de partida outra decisão do próprio STF, relatada pelo ministro Dias Tofolli, em um processo semelhante. Além da própria Constituição, que garante o direito à livre associação partidária.

Em 2011, o STF decidiu sobre uma ação semelhante, que pretendia impedir que parlamentares que migravam para o recém criado PSD, do ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, levassem consigo o tempo de TV e as verbas proporcionais do fundo partidário. Vamos lá, para entender: o fundo partidário, formado pelo nosso pobre dinheirinho, é distribuído entre os partidos de duas formas: 5% do seu total é distribuído igualmente entre todos os partidos constituídos; os 95% restantes são distribuídos levando-se em consideração o número de deputados eleitos para a Câmara Federal. A mesma lógica é adotada para a divisão do tempo do horário eleitoral gratuito.

O projeto em tramitação no Senado (ele já foi aprovado a toque de caixa na Câmara dos Deputados) quer impedir exatamente isso: que partidos recém-criados tenham acesso aos 95% dos recursos do fundo partidário e, também, ao tempo no horário eleitoral gratuito, através da adesão de deputados já eleitos. Essa proposta tem um alvo definido, o partido que está sendo criado pela ex-senadora Marina Silva, e que pode se tornar uma pedra no caminho da reeleição da presidente Dilma Rousseff.

Onde entra a diarreia?


As últimas discussões envolvendo o STF e o Congresso ocorrem sob o fantasma da interferência de um poder sobre o outro. Começou no ano passado, quando o recém eleito presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB/RN) jurou de pés juntos que iria retaliar o STF, que havia decidido que sobre a cassação dos parlamentares condenados no processo do Mensalão.

Embora deputados – condenados ou não – fizessem questão de bater bumbo sobre a tal ingerência do STF, a decisão do Tribunal, mais uma vez, estava baseada na lei. O embate nunca se resumiu sobre a quem caberia a última palavra no caso da cassação dos deputados condenados – à Câmara ou ao STF – mas ao que diz a lei. E a lei é clara: depois de transitado em julgado e encerrados os prazos dos recursos, deputado condenado na Justiça perde o mandato. É simples assim.

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